Abril Verde: Senado debate segurança no ambiente de trabalho

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Instituir uma política de Estado que efetive o sistema de prevenção de doenças e acidentes de trabalho e garantir instrumentos legais para a fiscalização em defesa do meio ambiente profissional e da saúde do trabalhador. Essas foram algumas das iniciativas defendidas por senadores e especialistas durante sessão de debates temáticos, no dia 13 de abril, para promoção do Movimento Abril Verde, mobilização criada para a conscientização sobre a segurança e saúde do trabalho.

Autor do requerimento que propôs a sessão, o senador Paulo Paim (PT-RS), observou que um ambiente de trabalho saudável implica em menos acidente, maior produtividade e bem-estar do trabalhador e de sua família. Ele apresentou dados do Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho – 2020, emitido pelo INSS, que registrou, naquele ano, cerca de 450 mil acidentes de trabalho no Brasil. Na visão de Paim, esses acidentes são totalmente “evitáveis” e o melhor caminho para enfrentar esse cenário seria fortalecer o sistema de proteção e prevenção.

“A participação de todos nesse movimento potencializa o processo de transformação das fábricas, escritórios, enfim, de todos os espaços de trabalho, em lugares mais seguros e produtivos, cada setor e cada trabalhador dando atenção e olhar de cuidado, na prevenção. Temos desafios imensos em todos os setores. No campo temos uma alta contaminação em razão do manuseio de agrotóxicos, com elevados índices de câncer. Precisamos de políticas públicas que visem à produção de alimentos saudáveis, crédito e assistência técnica aos agricultores. No campo e na cidade, os acidentes com máquinas e equipamentos ainda são uma realidade que mutila e ceifa a vida de trabalhadores”, disse Paim.

 

Falta de preparo e segurança

 

Segundo a OIT, as condições de trabalho inadequadas matam um trabalhador a cada 11 segundos no mundo. Ainda de acordo com o órgão, cerca de 4% do PIB mundial, cerca de US$2,8 trilhões, são perdidos por ano em impostos diretos ou indiretos devido a acidentes de trabalho.

No Brasil, somente em 2021, foram comunicados 571 mil acidentes de trabalho e mais de 2.487 mortes no trabalho.

Especialistas apontaram que tais acidentes não acontecem por puro acaso, mas por falta de preparo e segurança. Eles ainda explicaram que os números elevados desses registros acarretam grandes perdas para vários setores como impacto financeiro para as empresas, queda de produtividade, prejuízos altíssimos ao sistema previdenciário e o Sistema Único de Saúde (SUS), que acaba arcando com tratamento decorrentes de acidentes e doenças de trabalho.

A vice-procuradora-geral do Trabalho, Maria Aparecida Gurgel, afirmou que o movimento de conscientização sobre segurança do trabalho é um convite a reflexão de como a sociedade brasileira quer a evolução do país. De acordo com ela, os movimentos econômicos recentes e os fatores e fatos sociais, como os processos de migração e a revolução tecnológica e científica tem ampliado o número de trabalhadores submetidos a ambientes inseguros. Para Gurgel, é necessária a implantação de uma política de estado voltada à promoção de melhorias nas condições sociais e de trabalho dos trabalhadores.

“Devemos sair desse círculo vicioso e transformar tudo isso num círculo virtuoso. Mas, para isso, é preciso uma construção sólida de sistemas eficientes, resolutivos e resilientes que envolvam os entes públicos e privados vocacionados para a defesa do meio ambiente de trabalho e da saúde do trabalhador e da trabalhadora e, mais que isso, uma política institucional de Estado voltada para esse círculo virtuoso do mundo do trabalho, preservando a saúde, preservando a higidez física, a segurança, a autonomia de todos esses trabalhadores e trabalhadoras”, salienta Gurgel.

Informalidade

 

A procuradora do Trabalho e Coordenadora Nacional de Defesa Meio Ambiente do Trabalho, Marcia Kamei, disse que qualquer trabalho de prevenção e segurança no trabalho precisa passar, primeiro, por um trabalho eficiente de registro das ocorrências, sejam elas no trabalho formal ou informal. Segundo ela, não há comunicação de cerca de 20% dos acidentes com afastamento, que abrangem os casos mais graves e que geram benefícios, o que indica subnotificação nos números oficiais de acidentes e mortes em decorrência do ambiente de trabalho no país. Para ela, a falta de dados dificulta o planejamento de ações efetivas nessa área.

“Tanto o órgão previdenciário como o de saúde reconhecem a relevância desses dados para fins epidemiológicos. A vigilância epidemiológica e o controle de doenças é a base para a gestão de serviços. Eles orientam a implantação, o acompanhamento, a avaliação dos modelos de atenção em saúde e as ações de prevenção e controle de doenças”, informa Marcia Kamei.

 

Trabalho escravo

 

Segundo dados do Ministério do Trabalho de 2021, somente no ano passado, foram resgatadas 1.937 pessoas em situação de escravidão no Brasil. O país também já foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos em razão desse tipo de conduta. Para o secretário de Justiça na Defensoria Pública da União, Murillo Martins, é preciso avançar nesse enfretamento.

“Quando a gente fala em trabalho escravo, necessariamente a gente está falando em condições insalubres e degradantes de trabalho, sem a observância de condições mínimas de segurança no ambiente de trabalho. São trabalhadores que são colocados em alojamentos em péssimas condições, com trabalho extenuante, sem equipamentos adequados para o exercício do seu ofício”, relatou Martins.

O senador Paulo Rocha (PT-PA) reforçou o alerta de Martins ao defender que o Abril Verde também se volte para as questões ambientais, principalmente em relação as condições de exploração do índio e da floresta Amazônica.

“Vincular também a questão do verde, a questão daqueles que vivem na floresta, como os índios, por exemplo, que são os grandes protetores, guardiões da nossa Amazônia e, portanto, falar em meio ambiente e condições de trabalho inclusive para o mundo todo —  as condições da rua, as condições ambientais do calor, da terra”, argumentou Rocha.

 

Precarização

 

Para a senadora Zenaide Maia (Pros-RN), a reforma trabalhista e a ampliação da possibilidade de terceirização de serviços, inclusive para atividades fins, também contribuíram para a precarização do trabalho e, como consequência, para a elevação de casos de acidentes e doenças nesse ambiente.

“Nós tivemos um desmonte da CLT, em que houve mais uma precarização gravíssima. Passou a haver o chamado “trabalho intermitente”. Na verdade, passaram-se a contratar trabalhadores como se fossem tratores ou retroescavadeiras. Podem ser três horas hoje, duas amanhã. Isso ocorreu com trabalhadores e, inclusive, com professores. Houve universidade privada, aqui, que fez isto: demitiu todo mundo e ofereceu para receber por hora de trabalho. Isso já tirou o descanso de final de semana, as férias e tudo. E esses trabalhadores podem receber, sim, menos do que o salário mínimo”, conta Maia.

A diretora da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Débora Raymundo Melecchi, alertou ainda que o Brasil se enquadra como o quarto país no mundo em que mais morreram trabalhadores da saúde em razão da pandemia de covid-19. Mais de 11 mil trabalhadores dessa área foram a óbito no país por esta causa. Ela também manifestou preocupação com o adoecimento e o agravamento da saúde mental dos trabalhadores e a ausência de uma política pública efetiva de apoio a essas pessoas. Somente no ano de 2021, houve um aumento de 17% em relação à venda de medicamentos psicotrópicos no Brasil. Ela pediu atenção dos congressistas na revisão de normas que venham a trazer ainda mais danos à saúde do trabalhador.

“Porém, no nosso entendimento, este momento em que estamos vivendo um processo de revisão das normas regulamentadoras é, no mínimo, questionável, porque as revisões das normas, até agora, pretendem eliminar 90% das suas exigências, causando um tipo de banalização das situações de risco a que milhões de trabalhadores e trabalhadoras estão submetidos no seu dia a dia laboral”, destaca Débora.

Por outro lado, o especialista em Políticas e Indústria da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Rafael Ernesto Kieckbusch, enfatizou a necessidade de revisão no processo regulatório para sua adaptação a modernização do mercado de trabalho, das relações trabalhistas e pela introdução de novas tecnologias a esse ambiente. Para ele, empregadores, trabalhadores e congressistas precisam dialogar e buscar consenso no sentido de garantir a segurança do trabalhador e desburocratizar o sistema, estimulando a competitividade e melhorando as oportunidades de negócios no país.

“Existe um conjunto de iniciativas que são importantes para melhorarmos o ambiente regulatório e, nessa nova fase, vamos dizer assim, desse marco da revisão das novas NRs, conseguirmos reduzir ainda mais as taxas de acidentes. Estes são os nossos objetivos: melhorar o ambiente, trazer competitividade, trazer segurança jurídica, trazer um ambiente em que as normas sejam respeitadas e, principalmente, possam ser implementadas”, conta Kieckbusch.

Já o coordenador da Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes do Trabalho (Canpat), José Almeida de Jesus, acredita que o país já possui um ordenamento jurídico muito forte em relação ao sistema de proteção ao trabalho. No entanto, segundo ele, esse arcabouço não está sendo aplicado de forma efetiva como política de Estado.

“No mundo competitivo, no mundo globalizado, quem fizer a melhor gestão, o país que fizer a melhor gestão em segurança e saúde vai ser mais competitivo. As nossas empresas serão mais competitivas, vamos aumentar a competitividade e a produtividade do trabalhador com consequência de aumento de salário”, observa Jesus.

Ainda participaram da sessão o Procurador do Trabalho, Luciano Leivas; a auditora fiscal do Trabalho e Coordenadora de Fiscalização de Estabelecimentos de Saúde, no Estado do Rio de Janeiro, Ana Luiza Horcades; o presidente do Sindicato dos Técnicos de Segurança do Trabalho do Distrito Federal (Sintest-DF), Wilton Cardoso de Araújo; o diretor de Relações Institucionais da Associação Nacional dos Procuradores e das Procuradoras do Trabalho, (ANP), Bruno Martins Mano Teixeira; e a gerente executiva de saúde do Serviço Social da Indústria (Sesi), Katyana Aragão Menescal.

Origem do Movimento

 

O Movimento Abril Verde se justifica por registrar duas datas relacionadas ao tema: o Dia Mundial da Saúde, celebrado no dia 7 de abril; e o dia 28, Dia Mundial em Memória às Vítimas de Acidentes e Doenças do Trabalho. Esse último tem origem em uma tragédia ocorrida em 1969, quando se registrou a explosão de uma mina nos Estados Unidos da América, em que morreram 78 mineiros.

Fonte: Agência Senado

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