Artigo traz alerta sobre doença que afeta cortadores de cana-de-açúcar

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por Paulo Maia, Thais Santiago, Leonor de Campos e Luíz Roberto Silva

A rabdomiólise (rb) é uma patologia potencialmente fatal. Decorre da quebra e necrose do tecido muscular, o que libera substâncias intracelulares para a corrente sanguínea. A gravidade da doença varia conforme a quantidade de enzimas musculares liberadas no sangue. Concentrações baixas dessas enzimas no sangue apresentam efeitos assintomáticos. No entanto, elevadas concentrações podem resultar em desequilíbrio eletrolítico, insuficiência renal aguda e cardiopatias, que podem levar o indivíduo à morte. Uma causa importante da doença é a atividade muscular excessiva exercida em altas temperaturas. O pior estágio da síndrome é a incidência de insuficiência renal aguda que em casos graves têm uma taxa de mortalidade de, aproximadamente 8%.

Os cortadores de cana-de-açúcar estão, frequentemente, expostos a ambientes quentes e sua atividade laboral exige um grande esforço físico. No entanto, há pouca literatura relacionando a insuficiência renal aguda e a morte desses trabalhadores à rb, embora sobre as mesmas condições haja relatos de doenças induzidas pelo calor, como a exaustão térmica e a insolação, que são mais facilmente diagnosticadas. O objetivo deste artigo, portanto, é analisar essa patologia e relacioná-la com o esforço físico e a exposição ao calor dos cortadores de cana-de-açúcar.

A indústria e o trabalho de corte da cana-de-açúcar
Desde o tempo colonial cultiva-se a cana-de-açúcar no Brasil. As primeiras mudas chegaram aqui pelas mãos de Martim Afonso de Souza, um português que veio para o Brasil. O interesse dos portugueses não era apenas econômico. Eles visavam ocupar o território para protegê-lo das invasões estrangeiras. A necessidade de um grande número de trabalhadores foi suprida através da mão de obra escrava provinda da África. Cerca de 90% do território brasileiro localiza-se entre os trópicos de Câncer e Capricórnio, motivo pelo qual usamos o termo “país tropical”. A maior parte do Brasil situa-se em zonas de latitudes baixas, nas quais prevalecem os climas quentes e úmidos. Aproximadamente 70% da área plantada está localizada nos estados de São Paulo (52%), Goiás (9,5%) e Minas Gerais (8,9%), segundo dados fornecidos pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB).

No manejo correto da cana-de-açúcar, o clima é um fator preponderante. É necessário atender as exigências da cultura quanto à temperatura média do ar (diurna e noturna), precipitação pluvial e radiação solar. Para o brotamento dos toletes da cana-de-açúcar, a faixa de temperatura ideal de solo é de 32°C a 38°C, já para um crescimento forte e vigoroso que garanta alta produção e rendimentos de açúcar, a temperatura média ideal durante o dia deve estar entre 22°C e 30°C. Este cenário, por si só, mostra que os cortadores de cana trabalham em regiões que apresentam altas temperaturas na maior parte do ano.

Nas últimas décadas, o cultivo de cana intensificou-se no País, aumentando a área plantada e a produção de açúcar e álcool. Atualmente, o Brasil é um dos maiores produtores de cana-de-açúcar no mundo com, aproximadamente, 9 milhões de hectares de área cultivada e uma produção de 6,34 milhões de toneladas de colmos, 28,6 milhões de metros cúbicos de álcool e 35,5 milhões de toneladas de açúcar.

Grandes grupos empresariais nacionais e internacionais ingressaram no ramo do agronegócio sucroalcooleiro, buscando intensificação dos lucros. Com isso, aumentou a demanda de trabalho dos cortadores de cana. No entanto, essa demanda não é suprida sempre de forma legal, razão pela qual até hoje a fiscalização encontra pessoas trabalhando em situação análoga à escravidão.

Na década de 1950, cortavam-se três toneladas de cana por dia, passando a seis a partir de 1980 e, no final da década de 1990 e início da década de 2000, atingiu-se 12 toneladas de cana por dia, havendo relatos de até 20 toneladas. Mesmo com o aumento de produtividade e da intensidade do trabalho, a atividade básica dos cortadores em nada mudou.

Os rígidos procedimentos de trabalho dos “novos” modelos de gestão chegam a prescrever a posição em que os corpos dos trabalhadores devem ficar para dar os golpes de facão. Essa intensificação do trabalho tem provocado um desgaste maior dos trabalhadores, que são estimulados por sistemas de prêmios e punições. Continuamente a média de produção é elevada, o que induz ao sofrimento, dor, doenças e até mesmo à morte. Ainda segundo pesquisas, há registros de trabalhadores que utilizam álcool, drogas, maconha e crack na crença de que o uso dessas substâncias aumente a capacidade de trabalho.

Na realização de uma pesquisa ergonômica foi observado que um trabalhador que corta 11,5 toneladas de cana durante uma jornada de trabalho faz 3.994 flexões de coluna. Além disso, o estudo contabilizou uma média de 9.700 golpes de facão numa jornada onde os trabalhadores produziam cerca de 10 toneladas de cana por dia. A atividade exercida pelo cortador de cana dá para ser comparada com a de atletas corredores fundistas (longas distâncias). Eles não necessitam ter maior massa muscular como os corredores velocistas (curtas distâncias) e, sim, ter maior resistência física. Os cortadores exercem uma atividade repetitiva e exaustiva a céu aberto na presença de fuligem, poeira e fumaça por um período que varia entre 8 a 12 horas por dia.

O corte manual de cana-de-açúcar exige um trabalho intenso de braços e tronco, que gera uma quantidade de calor metabólico de 415 kcal/h. De acordo com as categorias de taxas metabólicas da American Conference of Industrial Hygienists- (ACGIH), essa atividade é considerada como trabalho pesado.

Nesse trabalho intenso associado às longas jornadas de trabalho e altas temperaturas, manifestam-se as câimbras seguidas de tontura, dor de cabeça, vômitos e convulsões. É habitual encontrar trabalhadores tomando soro nos serviços de urgência e emergência durante o pico da safra com alguns desses sintomas. Essas ocorrências são mais frequentes em dias quentes e secos. Os trabalhadores chamam essas ocorrências de “birola”, que corresponderia ao termo karoschi (japonês) e que designa uma situação clínica relacionada ao estresse ocupacional que pode levar à morte súbita por patologia coronária, isquêmica ou doença cerebrovascular.

Há diversos estudos em diferentes países voltados aos problemas de estresse térmico na indústria canavieira. No entanto, não há muitos estudos na literatura sobre a atividade de corte de cana e Rb. Ressalta-se que a rabdomiólise está relacionada ao esforço excessivo na realização das tarefas que resultam em uma alta carga térmica gerada pelo corpo, aliada, frequentemente à alta temperatura ambiental. Essa combinação independe de outras causas e é suficiente para que haja quebra do tecido muscular e, portanto, liberação de substâncias em quantidade nociva para o sangue, principalmente mioglobina na urina. O estudo mostra que a colheita de cana queimada está associada à disfunção renal aguda. Por outro lado, o Instituto de Pesquisa da Capacitação do Exército (IPCFEX) relata que exercícios intensos realizados em dias de altas temperaturas têm causado Rb em soldados.

O trabalhador que corta 12 toneladas de cana por dia de trabalho caminha cerca de 8.8 mil metros, despende milhares de golpes de podão, carrega 12 toneladas de cana em montes de 15 kg a uma distância de 1,5 a 3 metros, faz milhares de flexões e entorses torácicos para golpear a cana. Esse trabalhador perde, em média, 8 litros de água por dia. Todas as tarefas são realizadas frequentemente sob o sol forte e sob os efeitos da poeira e da fuligem expelida pela cana queimada. Esses trabalhadores trajam vestimentas que os protegem de cortes e queimaduras, mas causam-lhes um aumento de sua temperatura corporal. Sentem dores, cãibras, convulsões e os efeitos da desidratação. Conclui que a principal causa das mortes é o trabalho pesado e excessivo promovido pelo modo de remuneração, ou seja, o pagamento por produção.

A Rabdomiólise
A doença é conhecida há milhares de anos. A patologia provém da quebra e necrose do tecido muscular, o que libera substâncias intracelulares para a corrente sanguínea. A gravidade da doença varia conforme a quantidade de enzimas musculares séricas liberadas, podendo apresentar efeitos assintomáticos e, em casos de extrema elevação das enzimas, apresentar desequilíbrio eletrolítico, insuficiência renal aguda e cardiopatias, as quais podem levar a óbito.

Existem casos da doença no qual não há traumas tais como: drogas e toxinas, infecções, anormalidades eletrolíticas, endocrinopatias e miopatias inflamatórias, entre outros.
As causas de rabdomiólise podem ser agrupadas em 10 grupos: 1) traumáticas; 2) relacionadas com a atividade muscular excessiva; 3) alterações da temperatura corporal; 4) oclusão ou hipoperfusão dos vasos musculares; 5) tóxicas; 6) farmacológicas; 7) alterações electrolíticas e endócrinas; 8) infecciosas; 9) doenças musculares inflamatórias e 10) miopatias metabólicas.

O consumo de álcool, drogas lícitas ou ilícitas, esforço físico excessivo e prolongado em lugares quentes com extrema umidade relativa do ar e a desidratação favorecem a propagação da patologia.
Embora haja muitas causas, o conceito é um só: a quebra (lise) rápida de músculo esquelético (rabdomio) devido à lesão no tecido muscular. O próprio nome revela a sua principal característica: a deterioração do tecido muscular. Nessa deterioração as células musculares (miócitos) comprometidas liberam para a corrente sanguínea, entre outras substâncias, a mioglobina.

Os sintomas clássicos de Rb incluem dores musculares (mialgias), urina de coloração vermelha ou marrom, devido à mioglobinúria, e elevação de enzimas musculares séricas, incluindo a creatina quinase (CK). O grau de dor varia muito entre os pacientes e a fraqueza muscular pode ocorrer em pessoas com lesão muscular grave, embora, mais de 50% dos pacientes não se queixam de dor ou fraqueza, embora relatem sintomas adicionais, como: febre, mal-estar geral, taquicardia, náuseas e vômitos.

A rabdomiólise e a insuficiência renal aguda
A Rb pode levar à insuficiência renal aguda (IRA), razão pela qual a norma EB30-N-20.001, do Exército Brasileiro, ressalta a necessidade da terapia precoce para evitar a progressão da Rb para a insuficiência renal aguda. A IRA é caracterizada por uma deterioração da função renal que ocorre no decorrer de horas a dias, resultando na falência dos rins para excretar produtos nitrogenados e para manter o equilíbrio hidroeletrolítico e ácido-básico (DAHER et al., 2009).

A colheita da cana tem sido associada à uma epidemia de doenças renais crônica na América Central, afetando, principalmente, jovens trabalhadores saudáveis. Um estudo exploratório teve como objetivo avaliar os efeitos agudos da colheita de cana queimada sobre a função renal entre 28 trabalhadores brasileiros saudáveis. As amostras de urina e de sangue foram recolhidas no início e no final da temporada da colheita, e antes e no final de cada turno de trabalho. Todos os indivíduos apresentaram diminuição da taxa de filtração glomerular, estimada em 20% no fim do turno de trabalho, e 18,5% apresentaram creatinina sérica aumentada consistente com lesão renal aguda. Houve diminuição da quantidade de urina e sua densidade foi aumentada, enquanto o sódio sanguíneo foi diminuído. Neste cenário, os autores do estudo concluíram que a colheita de cana queimada causou disfunção renal aguda em trabalhadores saudáveis associada a uma combinação de desidratação, inflamação sistêmica, estresse oxidativo, e rabdomiólise.

A rabdomiólise e o esforço físico
Sabe-se que Rb pode ser derivada de esforços físicos intensos. Nos anos 1960, nos EUA, oito rapazes participaram de uma prova para oficiais da aviação, que consistia em exercícios extenuantes. Decorridas 38 horas após a prova, todos os recrutas apresentaram um quadro de mioglobinúria, função muscular comprometida e aumento de concentrações de enzimas musculares no sangue, de forma que a capacidade funcional demorou várias semanas para ser restaurada. Ainda no âmbito das forças armadas, um estudo realizado com trinta e três recrutas, candidatos a oficiais em Fort Benning, Georgia, mostrou que, após duas semanas de treinamento, eles apresentavam urina marrom e outros sintomas. A maioria dos candidatos precisou de duas a três semanas para recuperar a função muscular. Entretanto, após seis semanas, oito recrutas ainda sentiam fraqueza.

No Brasil, o comando do exército, por meio da Portaria nº 129, de 11 de março de 2010, aprovou a diretriz para a implantação do “Programa de Prevenção e Controle da Rabdomiólise Induzida por Esforço Físico e pelo Calor” e produziu material educativo sobre o assunto. Dois anos depois, em 2012, foi publicado nova portaria aprovando a norma EB30-N-20.001, que consiste em um Procedimento Assistencial em Rabdomiólise no Âmbito do Exército. O documento alerta que a prática de exercícios físicos em excesso pode provocar necrose muscular e Rb em indivíduos sem condicionamento físico adequado para a atividade, que apresentem baixos índices de concentração de potássio na circulação sanguínea (hipocalêmicos).

No âmbito da Medicina Desportiva, uma pesquisa mostrou que três atletas relataram dores musculares e urina escura após participarem da primeira sessão de um programa de musculação. Nestes casos, a doença se manifesta devido ao esforço que ocorre com maior frequência quando um ou mais fatores de risco estão presentes: falta de preparo físico e realização de exercícios em locais extremamente quentes e/ou úmidos, pois nessas condições há dificuldade de perda de calor por transpiração. O treinamento ideal seria o treino monitorado e personalizado. No entanto, não é raro o surgimento da patologia em atletas que ultrapassam os limites de seu corpo, a exemplo dos praticantes de rapel, trekking e corredores.

O exercício muscular extenuante pode causar miólise (dissolução das células musculares), especialmente em indivíduos não treinados ou em indivíduos que se exercitam em condições extremamente quentes e/ou úmidas, como é o caso dos cortadores de cana-de-açúcar iniciantes na atividade ou de cortadores que voltam à atividade, após um longo tempo de afastamento.

Após a prática de exercícios físicos ou trabalho em canaviais é comum ocorrer mioglobinemia (mioglobina no sangue), mioglobinúria (mioglobina na urina) e aumento de creatina quinase (CK) sérica subclínica, como ocorre em maratonistas. A mioglobina é uma proteína, cuja principal função é a de transportar o oxigênio aos músculos, necessário para o seu funcionamento. Sua estrutura é muito próxima da hemoglobina que transporta o oxigênio no sangue. A mioglobina é encontrada, quase que exclusivamente, no tecido muscular, apesar de haver uma pequena quantidade no sangue (6 a 85 ng/mL), mas, normalmente, não é encontrada na urina.

A rabdomiólise e o calor
Os trabalhadores que realizam atividades a céu aberto se expõem a calor intenso e merecem uma atenção especial. Frequentemente, esses trabalhadores exercem atividades pesadas, aumentando significativamente a quantidade de calor interno. Os cortadores de cana-de-açúcar, ao cortarem 12 toneladas geram cerca de 415 Kcal/h. Ressalte-se que as trocas térmicas com o ambiente são dificultadas por causa das vestimentas e pelo uso obrigatório de equipamentos de proteção individual, tais como luvas de raspa, capuz, botas, óculos, perneira e mangote. Esses e outros fatores podem resultar em sobrecarga térmica, causando solicitações fisiológicas capazes de provocar irritabilidade inexplicável, confusão mental, câimbras, fadiga severa repentina e outras disfunções com potencial de levar à morte no caso de falência do sistema termorregulador do corpo.

Com o advento das mudanças climáticas, a temática “calor” tem sido cada vez mais abordada cientificamente. As ondas de calor, caracterizadas por um período de tempo com temperaturas bem acima da média, são consideradas a principal causa de mortalidade humana entre eventos da natureza. Devido às mudanças climáticas, as ondas de calor estão se tornando cada vez mais frequentes e intensas. Para o Brasil, o relatório “The Global Climate 2001-2010, A Decade of Climate Extremes” identificou, em 2006, a ocorrência de uma das ondas de calor mais significantes do mundo.

O excesso de calor, independentemente da causa, pode resultar em lesão muscular. Tanto a hipotermia, como a hipertermia, respectivamente, aumento ou diminuição da temperatura corporal, podem desencadear a síndrome.

Rabdomiólise e desordens eletrolíticas
Quando as células do tecido muscular esquelético, ou miócitos, são danificadas, além da mioglobina, são liberados componentes intracelulares na corrente sanguínea, incluindo eletrólitos e outras proteínas sarcoplasmáticas, notadamente, creatina quinase (CK), alanina aminotransferase (TGO) e asparato aminotransferase.

Em casos graves, desordens eletrolíticas e insuficiência renal aguda podem ocorrer, o que leva a situações de risco de vida. Uma grande ênfase deve ser dada às alterações eletrolíticas que ocorrem em trabalhos extenuantes, como: a hipo ou hipercalemia (níveis baixos ou elevados de potássio no sangue), a hipocalcemia (concentração baixa de cálcio) e a hiperfosfatemia (aumento de fosfato no sangue) que ocorrem devido à lesão celular. Essas alterações, agravadas ou não pela insuficiência renal aguda, são as principais complicações da Rb.

O trabalho extenuante pode causar a falta de suprimento sanguíneo para o tecido muscular devido à obstrução causada por um trombo (isquemia muscular), o que ocorreria mais rapidamente em indivíduos com uma quantidade baixa de potássio na corrente sanguínea (hipocalêmicos) porque ele é essencial para a vasodilatação da microcirculação dos músculos.

Recomendações
Esse artigo sobre Rb visa mostrar que a patologia tem muitas causas. Os cortadores de cana constituem um grupo de trabalhadores especialmente sujeitos a dois fatores importantes associados à doença: o calor intenso e a atividade pesada. No entanto, há outros fatores que aumentam o risco de casos de rabdomiólise dessa população, exemplificados pelo consumo de álcool, drogas, picadas de insetos e cobras e uso de remédios amplamente utilizados pela população em geral.

O diagnóstico pode ser difícil, requerendo um elevado grau de suspeição. Na área ocupacional, no Brasil, ela é uma doença despercebida, como muitas outras foram no passado, havendo pouquíssima literatura ligada às atividades laborais. É um pouco mais explorada no campo esportivo e nas normas do exército. A síndrome sequer é citada no Manual de Procedimentos para os Serviços de Saúde – Doenças Relacionadas ao Trabalho do Ministério da Saúde.

Essa ausência de conhecimento resulta na exposição de milhares de trabalhadores que frequentemente realizam atividades pesadas, especialmente, os cortadores de cana. Tais condições podem estar relacionadas à organização com trabalho, exemplificadas pelo pagamento por produção ou por prêmios, que induz um ritmo, levantamento de pesos e posições corporais para realização das tarefas acima da capacidade do trabalhador; ou às condições do próprio ambiente de trabalho, exemplificadas pelo calor intenso e alta umidade aonde as tarefas são executadas. Os danos podem ser permanentes ou transitórios, e podem ser evitados com que medidas de prevenção e monitoramento dos trabalhadores.

Destaca-se, ainda, que a manifestação da doença pode ocorrer em ambientes onde não haja profissionais da saúde para fazer o diagnóstico e uma rápida intervenção, aumentando os riscos de morbimortalidade. O Serviço Pastoral do Migrante, entre as safras 2004/2005 e 2005/2006, contabilizou a morte de 10 cortadores de cana em uma região canavieira de São Paulo. Eram trabalhadores jovens, com idades variando entre 24 e 50 anos. Todos eram migrantes provenientes de outras regiões do País (Norte de Minas, Bahia, Maranhão, Piauí) para o corte de cana. As causas mortis constantes nos atestados de óbitos são vagas, tais como: parada cardiorrespiratória por causa indeterminada, enfarto do miocárdio e causas desconhecidas.

Por essas razões faz-se necessário que, no âmbito governamental, sindical e empresarial se abram caminhos para a pesquisa ocupacional em relação à rabdomiólise e à preparação de profissionais capazes de prevenir, diagnosticar, contabilizar e tratar a doença. Ainda no âmbito governamental, recomenda-se a criação de um programa em SST visando a prevenção da doença entre os expostos ao calor intenso, priorizando os que realizam atividades pesadas, como os que laboram no corte de cana-de-açúcar.

 

Paulo Maia é engenheiro mecânico e de segurança do trabalho, doutor em Engenharia Civil e pesquisador da Fundacentro/Campinas (SP)
Thais Santiago é engenheira agrônoma e a segurança do trabalho
Leonor de Campos é psicóloga
Luíz Roberto Silva é engenheiro agrônomo e de segurança do trabalho e mestre Engenharia Agrícola

 

*Este artigo foi publicado na edição nº 448 da revista Cipa (janeiro)

 

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