MPT e Unicamp debatem sofrimento mental e morte relacionados ao trabalho
É cada vez mais comum abrir as redes sociais e encontrar relatos e desabafos sobre o mundo do trabalho. Afinal, como explicou Luci Praum, professora da Universidade Federal do Acre, no seminário Sofrimento Mental e Morte entre Trabalhadores e Trabalhadoras, dias 24 e 25 de maio, realizado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) em conjunto com a Unicamp, “O trabalho tem uma centralidade econômica, social, política, cultural e até psíquica na vida do indivíduo”.
Na mesa que debatia Assédio e Suicídio ligado ao Trabalho, a professora universitária se juntou ao também professor Roberto Heloane, da Unicamp, e aos sindicalistas Mauro Salles (Contraf-CUT) e Cleonice Caetano, não só para informar e debater sobre a realidade, mas para apontar ferramentas e formas de superação das tragédias que vêm ocorrendo.
Causas
Especialistas e sindicalistas foram unânimes em apontar a precarização do trabalho como fonte de sofrimento para o trabalhador. As transformações cada vez mais velozes no mundo do trabalho, como as terceirizações, as metas, a remuneração por metas, a vigilância dos softwares, a pressão por maior produtividade não são passíveis de serem absorvidas pelos trabalhadores na velocidade em que são criadas. “O aumento da produtividade exigido ultrapassa a capacidade física e mental humana”, reflete a professora.
“Estamos vivendo a conversão dos ambientes do trabalho em espaços de competição com metas e avaliações de desempenho. São elementos significativos que têm um impacto na saúde dos trabalhadores. Esses espaços têm se convertido em locais de um tipo particular de violência. Qual o preço que se paga por adaptar-se às relações sociais contemporâneas e o mundo do trabalho?”, questiona Luci Praum.
Outro motivo de sofrimento mental criado pelas novas formas de trabalho é a solidão. Roberto Heloane explica: “As novas formas do trabalho destroem o coletivo e dessa forma permitem o assédio, que é produto da solidão”. A destruição dos laços de solidariedade entre os trabalhadores ocorre no nível do trabalho em si, mas também institucionalmente.
Com o avanço das políticas neoliberais, as leis e regulamentos que regem o mundo do trabalho vêm sendo dissolvidas. Somente nos últimos cinco anos, o Brasil passou por uma duríssima reforma previdenciária, a reforma trabalhista, uma minirreforma trabalhista e o ataque aos sindicatos com a mudança do financiamento dessas instituições, assim como o constante ataque da grande mídia visando desacreditar as organizações dos trabalhadores.
Resolução 19 da OIT
“Não é à toa que a tática mais usada (para forçar os trabalhadores a se demitirem) até hoje é a do isolamento. Isola-se a pessoa, corta-se a comunicação com os colegas e o sujeito adoece. Daí para a depressão é um pulo. E com a depressão, o sujeito começa a pensar que merece a tal punição, e que o problema está com ele”, explica Heloane.
Essa forma de massacrar o trabalhador não é advinda da maldade de um ou outro gerente, ela é estrutural do avanço do capitalismo e das novas formas de trabalho. Da mesma forma, o adoecimento do trabalhador não é fruto da sua saúde e características psicológicas individuais. “Não existe adoecimento mental que se constitua isoladamente do corpo e das relações humanas”, relembra a professora da universidade do Acre.
Ao mesmo tempo, Luci explica: “Existe uma tentativa de reduzir o adoecimento a vida do trabalhador. E o suicídio tem se tornado mais comum porque tem ocorrido dentro do trabalho e com mensagens que fazem referência ao ambiente de trabalho”.
“O suicídio relacionado ao trabalho não é um fenômeno deslocado, é uma resposta brutal às formas de precarização”, afirma Luci Praum
Segundo Praum, o fenômeno do suicídio ligado ao trabalho vem crescendo nas últimas três décadas como consequência do avanço das mudanças aceleradas a que são submetidos aos trabalhadores em consequência das mudanças do mundo.
“Muito recentemente, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), instada pelos protestos de 2015, resolveu criar uma resolução, a de número 19, que é um conjunto de diretrizes a serem endossadas pelos países membros, no que concerne a evitar o assédio moral, discriminação e assédio sexual”, informa Roberto Heloane. Porém, poucos países ratificaram a resolução, e o Brasil não estava entre o seleto grupo.
Segurança psicológica
Na busca de promover ambientais de trabalhos mais seguros e saudáveis algumas empresas brasileiras estão se atentando para novas necessidades emocionais e mentais dos colaboradores. Os gestores dessas empresas já se conscientizaram que construir e manter um ambiente de trabalho saudável fisicamente e mentalmente para os funcionários é um desafio que todas as empresas precisam enfrentar em algum momento se desejam ter uma equipe engajada e produtiva. Cada vez mais empresas estão começando a se preocupar com um fator muito importante para o sucesso dos negócios como um todo: a segurança psicológica no ambiente de trabalho.
O termo “segurança psicológica” foi cunhado e estudado pela professora Dra. Amy Edmondson, da Harvard University, nos Estados Unidos. Ela determina que a segurança psicológica é “uma crença compartilhada entre os membros de uma equipe de que a equipe é segura para a tomada de riscos interpessoais”. Assim, a segurança psicológica pode ser entendida como o fator que proporciona um ambiente de trabalho seguro e confortável para que as pessoas sejam autênticas, criativas e possam compartilhar suas ideias, dúvidas e visões sem receios.
“Com um mercado de trabalho cada vez mais dinâmico, muitas empresas brasileiras precisam se adaptar às novas necessidades dos funcionários em relação à segurança e harmonia no ambiente de trabalho”, afirma Thomas Carlsen, COO e co-fundador da mywork, startup especializada em gestão de departamento pessoal e controle de ponto online para RH. “Cuidar para que os colaboradores se sintam valorizados, ouvidos e constantemente aprendendo é essencial para a criação e manutenção de equipes de alto desempenho”, diz o executivo.
Estabelecer uma rotina de feedbacks recorrente e bem desenhada é um bom primeiro passo para promover a segurança psicológica. Quando a empresa cria um canal transparente e confiável que permite a escuta ativa, a troca de percepções, opiniões e avaliações cria-se também uma rotina de desenvolvimento e troca entre lideranças e liderados.
Conforme o executivo, o departamento de RH deve ser diretamente envolvido na estruturação de canais e processos de feedback que visem o desenvolvimento do capital humano da empresa como um todo.