Covid-19 – Não configuração de doença ocupacional
É sabido que muitos trabalhadores foram acometidos e sofreram com as consequências decorrentes da Covid-19, sendo que alguns ainda sofrem com as suas sequelas e outros vieram a falecer. Em razão disto, surgiu a controvérsia se a doença poderia ser enquadrada como doença ocupacional, ensejando pretensões reparatórias, inclusive com a interposição de ações de indenização na Justiça do Trabalho, tendo como parte os herdeiros dos falecidos trabalhadores.
O Ministério da Saúde, por intermédio da Portaria nº 454/2020, reconheceu, em 20 de março de 2020, o estado de transmissão comunitária do novo coronavírus, ou seja, admitiu que a contaminação pelo vírus da Covid-19 estava ocorrendo sem que se pudesse rastrear a origem da contaminação, sem vínculo a um caso confirmado, circulando entre as pessoas, independente de terem viajado ou não para o exterior.
Segundo Tadeu de Abreu Pereira, advogado trabalhista, sócio da Abreu & Vale Advogados e consultor do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo no Estado de Goiás (Sindiposto), a partir de então, não era mais possível se definir a origem da contaminação, já que o vírus circula silenciosamente, inclusive, em contaminados assintomáticos, que carregam o vírus e o disseminam no ambiente, sem que a doença manifeste qualquer sintoma em seu portador.
Nexo causal
Nesse cenário, o advogado explica que não se pode afirmar que o trabalhador tenha contraído o vírus em serviço, uma vez que é impossível saber a origem da contaminação, quem ou o que transmitiu o vírus ao De Cujus, em que lugar ocorreu etc. Portanto, não é possível precisar o momento e origem do contágio em fase de contaminação comunitária.
“Nesta linha, fica claro que a Covid-19 é uma doença comum, não sendo razoável caracterizá-la como uma doença do trabalho, pois a contaminação pode ocorrer em qualquer lugar, inclusive dentro de casa”, diz Tadeu de Abreu Pereira.
Ele registra que a Lei 8.213/1991, ao tratar de doenças que não são consideradas como doença do trabalho, assim dispôs no artigo 20 §1º “d”:
Art. 20. Conforme o advogado, consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:
[…]
[…]
- 1º Não são consideradas como doença do trabalho:
[…]
- d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.
Se para as doenças endêmicas a norma exceptua a configuração do caráter ocupacional, mais ainda se vale para a doença pandêmica, como é o caso da Covid-19.
“Considerando-se que as doenças do trabalho não presumem o nexo causal com a atividade desenvolvida na empresa, nesse caso, sobretudo, não é razoável atribuir à função de frentista, por exemplo, a causa da contaminação pelo vírus do coronavírus”, informa Tadeu de Abreu Pereira,
Ademais, de acordo com o especialista, ainda que o trabalhador frentista falecido em razão da Covid-19, exercesse atividade essencial isto, por si só, também não enseja a configuração de doença ocupacional. Isto porque, a atividade de frentista não se insere em grau de risco elevado.
“Dessa forma, não há como caracterizar a Covid-19 como doença ocupacional, pois não há como se presumir o nexo causal entre a atividade laborativa e a enfermidade”, avalia o advogado.
De acordo com ele, se não se presume a natureza ocupacional da doença da Covid-19, ela só pode ser cogitada em caráter excepcional, cabendo aos trabalhadores e/ou aos herdeiros daqueles trabalhadores que faleceram, o ônus de provar que a empresa concorreu diretamente para a contaminação do trabalhador doente/falecido, deixando de adotar as medidas de higiene, saúde e segurança preconizadas para evitar a contaminação, não proporcionando um ambiente de trabalho seguro ao obreiro.
Assim, segundo Tadeu de Abreu Pereira, caberá aos empregadores observarem e cumprirem o previsto nos artigos 154, 157 e 158 da CLT e demais normas de segurança e saúde do trabalho, especialmente as que foram editadas para combater os efeitos da Pandemia da Covid 19, como por exemplo a Portaria Interministerial MTP/MS Nº 14, de 20 de janeiro de 2022, que estabeleceu novas medidas para prevenção, controle e mitigação dos riscos de transmissão do coronavírus (Covid-19) em ambientes de trabalho.
Vale registrar, que em recente acórdão de lavra do Des. Paulo Pimenta, a 2ª Turma do TRT da 18ª Região, pacificou entendimento no seguinte sentido:
COVID-19. DOENÇA OCUPACIONAL. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE VINCULEM AO TRABALHO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. A COVID-19 pode ser classificada como doença ocupacional, desde que cabalmente comprovado que o Coronavírus foi contraído durante a jornada laboral e, ainda, quando o meio ambiente de trabalho expõe o empregado a risco acentuado de contaminação, pela sua própria natureza ou pela ausência de adoção das medidas de prevenção pelo empregador. ROT 0010396-03.2021.5.18.0122.
“Em conclusão, a nosso sentir, especialmente no setor de revenda de combustível, não resta dúvida de que a Covid-19 não se enquadra como doença ocupacional, competindo aos empregadores adotarem todas as medidas de prevenção, proteção e segurança da saúde e integridade física de seus trabalhadores”, conclui Tadeu de Abreu Pereira.