Gestão no trabalho com HOP, BBS, S2 e mais ferramentas. Precisamos de tudo isso?

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Eduardo Machado Homem

Engenheiro químico e de segurança do trabalho, mestre em Engenharia Ambiental e MBA em Gestão Empresarial. Atua há 20 anos na área de segurança do trabalho e meio ambiente e hoje é diretor da Do Safety, consultoria em Cultura, Gestão e Liderança.

 

Precisamos que nossos líderes compreendam a importância de um ambiente de trabalho que trate nossas pessoas com dignidade para que todos possam voltar para o convívio com suas famílias. Precisamos que as organizações aceitem que a vida humana deve ser um valor intrínseco ao desenvolvimento do seu negócio.

A dignidade oferecida através do trabalho se transforma num agente de promoção pessoal e profissional das pessoas para a sociedade. E esta dignidade que o trabalho proporciona não se limita ao ambiente organizacional, mas a tudo que se conecta com o bem-estar, lazer e saúde de cada colaborador e sua família.

As empresas, através de seus líderes e recursos, devem garantir aos colaboradores que as condições físicas de trabalho, os padrões existentes, os treinamentos, a gestão dos riscos, o respeito, a justiça e o cuidado com sua integridade física e mental estejam plenas, disponíveis e acessíveis.

E quando se trata de todas essas garantias, o colaborador não pode ser considerado um ente passivo no processo. Para isso, empresas e seus líderes precisam chamá-los e envolvê-los para ser parte integrante e relevante de todo o processo de projeto, dimensionamento, instalação, operação, controle, monitoramento e fiscalização de suas atividades.

 

Espírito da lei

 

Até aqui, esse texto pode parecer que foi escrito a partir do que existe de mais atual em termos de segurança baseada em comportamento (BBS), HOP, Safety 2, Segurança Diferente e qualquer outra filosofia ou metodologia para desenvolvimento da Segurança do Trabalho. Mas não foi.

Esse texto foi idealizado e transferido para o “papel” a partir da constituição brasileira e do que define nossas normas regulamentadoras. Se eu considerasse, para esse texto, consultar normas técnicas específicas, o texto ficasse ainda mais “atual”.

Talvez você não esteja fazendo a associação porque os termos na nossa legislação são outros. Ao invés de usar termos como “empresa”, “organização” ou “líderes”, as legislações e normas usam o termo “empregador”. Ao invés de “colaborador”, usa-se “trabalhador” ou “empregado”. Ao invés de falar de “cuidado”, fala-se de “dignidade” nas leis e NRs. O que importa, é o espírito da lei, não a modernidade dos termos corporativos.

Há algum tempo eu ouvi que, no Brasil, estamos presos a uma compreensão equivocada do que é segurança do trabalho e que essa compreensão equivocada tem uma ligação direta com um certo foco exagerado na legislação e nas NRs. Gostaria muito que isso fosse verdade. Quem conhece a segurança do trabalho profundamente e, da mesma maneira, conhece a realidade brasileira, sabe que a aderência à requisitos legais é muito baixa. Coisas básicas como proteções de máquinas e fornecimento de EPI ainda são dilemas em muitas empresas.

E essa situação de aderência precária às normas regulamentadoras e outras leis é o que está intimamente ligada aos acidentes de trabalho que não aparentam ter qualquer tendência de redução, ou seja, há mais de uma década está no mesmo patamar.

 

Gestão de pessoas

 

É errado associar a pouca importância dada ao atendimento de requisitos legais à uma espécie de incompreensão do que existe de mais atual em conceitos sobre comportamento, cultura, gestão e aprendizado organizacional. Da mesma maneira que o atendimento às NRs é deixado em segundo plano, qualquer outra filosofia ou abordagem que se proponha a resolver “tudo que está aí” também será escanteada.

Pergunte sobre as razões das pessoas usarem o cinto de segurança no carro. Pergunte-se por quais motivos evitam beber quando sabem que precisarão dirigir. Você pode não gostar do que ouvirá, mas a potencial responsabilização por quem tem a autoridade de fazê-lo é parte da resposta. Alguns dirão que se trata de comando e controle e que isso deve ser preterido em nome de uma forma mais atual e humanizada de gestão de pessoas. É possível que estejam certo e eu gostaria que estivessem, afinal, comando e controle não funciona sempre e nem indefinidamente.

Abordagens baseadas em comportamento, estratégias voltadas ao desenvolvimento da cultura de segurança e novas metodologias e filosofias fazem muito sentido em algumas organizações onde o atendimento a requisitos legais não é mais um problema. Mas eu sou muito cético quando uma empresa mostra um nível de aderência de 80% aos requisitos legais e o diagnóstico de cultura de segurança diz que a organização é dependente (Bradley) ou calculativa (H&M).

Eu sei que é uma postura polêmica e difícil, mas se olhássemos para nossa legislação e normas regulamentadoras com o mesmo carinho e acolhimento que olhamos para outras filosofias e metodologias, teríamos empregadores oferecendo condições de trabalho mais dignas aos trabalhadores ou, se achar mais adequado, organizações promovendo um ambiente de cuidado e risco zero em que os colaboradores são respeitados e parte do processo.

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