Mentalidade escravagista permeia trabalho rural e doméstico, denunciam sindicalistas

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O trabalho rural e do trabalho doméstico são os que trazem mais marcas do passado escravagista que marca a História brasileira, segundo afirmaram os participantes de audiência pública na subcomissão do Estatuto do Trabalho, de segunda-feira (5). E a conjuntura atual tem aberto espaço para que maus empregadores imponham suas agendas, eliminando direitos históricos destas categorias, que já estavam entre as mais socialmente vulneráveis.

Os resultados da audiência pública serão considerados na elaboração do Estatuto do Trabalho, que, segundo anunciou o  vice-presidente do colegiado, Paulo Paim (PT-RS), será apresentado para análise do Senado no dia 1º de maio, Dia Internacional do Trabalho.

O assessor jurídico da Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados Rurais (Contar), Carlos Eduardo, disse, na audiência, que o campo vive uma tragédia após a aprovação da reforma trabalhista, que enfraqueceu o poder dos sindicatos. A dispensa da participação destas entidades nas negociações coletivas e da obrigatoriedade na homologação das rescisões contratuais tem prejudicado milhões de trabalhadores, segundo ele, que antes recorriam a estas entidades em busca do cumprimento de seus direitos.

Regulamentação da escravidão

Para Lucas Silva, representante do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), a bancada ruralista ainda tem como norte a aprovação do PL 6442/2016, em análise na Câmara dos Deputados, que a seu ver tem um enfoque “explicitamente escravagista”. Citando artigos deste projeto, Silva alerta que ele prevê o pagamento aos trabalhadores rurais “em qualquer espécie”, o que eliminaria por exemplo a obrigatoriedade do pagamento em dinheiro.

– É um projeto assustador, e sinal de grande ousadia o simples fato de apresentá-lo ao Congresso Nacional. A remuneração em qualquer espécie abre a possibilidade do trabalhador não receber salário, de poder ser pago em troca de comida, de roupa usada ou de uma lona preta que vão chamar de moradia – protestou o auditor-fiscal do trabalho.

Citando outros artigos deste projeto, Silva conclamou os cidadãos a acessá-los pessoalmente e lerem, por compreender que “é algo realmente esdrúxulo, que beira o inacreditável”. Lembrou que a proposta prevê a extensão da jornada de trabalho diária na área rural para 12 horas, sem qualquer contrapartida. Também regulamenta o horário de almoço em 30 minutos, e deixa de contar o tempo de deslocamento dos trabalhadores na jornada diária, mesmo quando efetuado pelos próprios empregadores.

O projeto também prevê a adoção do trabalho contínuo por até 18 dias, o que na prática acabaria com o descanso semanal remunerado. O teor da proposta ainda foi criticado pelo senador Paulo Paim.

– Está na Bíblia, até Deus precisou descansar no 7º dia. Conheço este projeto e seu caráter acintoso, ainda mais quando lembramos como é duro o trabalho na roça, feito em condições climáticas extremamente desfavoráveis – afirmou.

Normas de saúde e segurança

Também foi criticada por Silva e pela representante do Ministério Público do Trabalho (MPT), Débora Farias, o fato de o PL 6442/2016 determinar explicitamente a revogação da Norma Regulamentadora 31/2005 (mais conhecida como a NR 31), do Ministério do Trabalho.

Esta Norma trata das condições de saúde e segurança dos trabalhadores no campo, e traz regras básicas como o fornecimento de água potável, instalações sanitárias e proteção no manejo dos agrotóxicos.

– Revogar a NR 31 significa retroceder séculos. Participei de uma reunião na ONU, em que eles ficaram espantados, inclusive com o fato de o Brasil ainda ter que regulamentar este tipo de coisa. Durante séculos os trabalhadores rurais foram tratados como animais neste país, é isso que alguns setores querem ver de volta, a legitimação da brutalidade – protestou a procuradora.

Domésticas

Também falando pelo Sinait, a auditora do trabalho Lívia Ferreira alertou que ainda hoje, à despeito da aprovação de leis recentes reconhecendo direitos das trabalhadoras domésticas, menos de 1/3 estão conseguindo atuar com carteira assinada.

Já a presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), Luiza Pereira, afirmou que se a reforma da Previdência for aprovada nos moldes como foi proposta pelo governo, grande parte destas profissionais não conseguirão mais se aposentar.

– Vamos voltar ao Brasil como era há algumas décadas atrás, quando as domésticas iam pedir esmola depois dos 45 anos. Esta é uma área que tem problemas muito sérios de empregabilidade de acordo com a faixa etária – afirmou.

 

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