As MPs de flexibilização dos contratos de trabalho tardaram, mas chegaram. Será que vão ser úteis?

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Por Erika Mello

Desde o encerramento do estado de calamidade pública, em 31/12/2020, a sociedade aguarda ansiosa pela prorrogação ou reedição do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e/ou por medidas de flexibilização dos contratos de trabalho, mas as medidas só chegaram agora, na semana de um Dia do Trabalhador que apresenta uma realidade de mais de 14 milhões de desempregados.

Enfim, as novas MPs foram editadas (MP 1.045/2021 e MP 1.046/2021), no entanto, infelizmente não serão úteis para reverter muitas demissões decorrentes das restrições do mercado e de atividades para contenção da disseminação do Coronavírus. A boa notícia é que trabalhadores que estiverem em período de aviso prévio poderão ter a rescisão do contrato revertida e a manutenção do emprego com a aplicação das medidas autorizadas.

Outro fator de influência para os resultados esperados das medidas disponibilizadas é que a retomada começou a acontecer, mas de forma muito tímida, com a economia ainda muito incerta, consumidores com a renda totalmente alterada, mercado de trabalho complicado e perspectivas muito obscuras.

A MP 1045/2021 repete as medidas editadas na MP 936/2020 convertida na Lei 14.020/2020, tendo como foco as regras de redução de jornada e salário e suspensão dos contratos de trabalho, bem como o pagamento do Benefício Emergencial pelo Ministério da Economia. Já a MP 1.046/2021 reproduz flexibilizações da MP 927/2020, que acabou não sendo convertida em lei, reeditando regras como teletrabalho, antecipação de feriados e postergação do recolhimento do FGTS.

Felizmente, também, diferentemente das especulações que acompanhamos até a efetiva edição da MP, o Benefício Emergencial será calculado tomando como base a tabela do seguro-desemprego a que o empregado faria jus, mas não será tratada como antecipação de seguro-desemprego para os empregados que tiverem os contratos de trabalho reduzidos ou suspensos. Ou seja, o trabalhador não será prejudicado caso seja posteriormente dispensado pela empresa, exceto se receber indevidamente o Benefício Emergencial, pois nessa hipótese a MP determina que ele poderá ter o valor recebido indevidamente compensado com parcelas futuras do próprio Benefício ou do seguro-desemprego a que tiver direito.

As regras gerais das medidas de flexibilização não sofreram grandes alterações relativamente ao que foi editado em 2020, mas o cenário mudou, as experiências também e temos alguns destaques e dicas de ouro:

  • É muito importante a empresa ficar atenta a todos os detalhes das medidas que pretende implementar e considerar o histórico de medidas que já utilizou, as especificidades da sua atividade no cenário atual e perspectivas a curto e médio prazo, bem como as especificidades dos seus empregados, para tomar a decisão de maneira equilibrada e considerando de maneira assertiva todos os riscos;
  • Medidas como antecipação de férias e feriados ilimitadamente, períodos de descanso essencial do qual os empregados serão privados durante longos períodos futuros de trabalho, precisam ser analisadas com olhar sistêmico;
  • É importante saber que dependendo da data a partir da qual a empresa iniciar a medida de redução de jornada e salário ou a suspensão do contrato de trabalho, a vigência não poderá ser de 120 dias, porque a MP estabelece que o termo final não pode ultrapassar o período de vigência do Programa, ou seja, o limite é 26/08/2021, a menos que haja medida posterior que prorrogue esse prazo. Quem aplicar as medidas daqui 20 dias, por exemplo, só poderá estabelecer a validade por 100 dias. Esse limite considera a aplicação de apenas uma das medidas ou a aplicação de ambas as medidas sucessivamente ao mesmo empregado.
  • As regras das novas MPs não valem retroativamente, ou seja, empregadores que por conta própria estabeleceram medidas de flexibilização com os seus empregados, mesmo que compatíveis com as regras que foram autorizadas agora, não estão garantidos quanto aos riscos trabalhistas do período passado;
  • Formalizar corretamente, observando as regras legais, agir com transparência, apoiar e deixar as regras claras é um fator essencial. Existem regras específicas que autorizam, por exemplo, o acordo individual, mas para algumas situações é necessário o acordo coletivo, com intervenção do sindicato;
  • Teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho à distância é trabalho! Se for aplicada alguma medida de redução de jornada, suspensão do contrato, antecipação de férias ou feriado, por exemplo, não pode haver nenhuma prestação de serviços do empregado, mesmo que parcialmente, nesse período, caso contrário será descaracterizada a medida e o empregador terá que pagar imediatamente a remuneração e os encargos, ficando sujeito, ainda, às sanções legais e administrativas pela prática irregular
  • As medidas de redução de jornada e salário e suspensão de contrato colocam o empregado em situação de garantia provisória no emprego, mas os empregados que ainda estiverem no curso de período de garantia decorrente de acordos celebrados com base na MP 936/2020 ou Lei 14.020/2020, terão a suspensão da contagem desse período de garantia enquanto receberem o Benefício Emergencial decorrente de medidas instituídas com base na MP 1.045/2021. O prazo volta a contar após o período de garantia de emprego decorrente das novas medidas adotadas e a empresa tem que considerar isso;
  • As empresas precisam ficar atentas para Convenções Coletivas ou os Acordos Coletivos de Trabalho celebrados, pois poderão ser renegociados para adequação de seus termos no prazo de 10 dias corridos, contado da data de publicação desta Medida Provisória. O acordo individual, por sua vez, prevalecerá sobre as normas coletivas quando for mais benéfico ao trabalhador;
  • As empresas poderão preservar o caixa postergando o recolhimento do FGTS das competências abril, maio, junho e julho de 2021 para realizar em até quatro parcelas a partir de setembro de 2021.

Por fim, as medidas disponíveis são bem-vindas e serão úteis a muitas realidades, mas a tomada de decisão e as ações implementadas precisam de uma análise sistêmica e multifatorial do cenário que se pretende enfrentar, seus objetivos, histórico das relações, especificidades dos indivíduos envolvidos, visão de curto, médio e longo prazo, equilíbrio e proporcionalidade, riscos e benefícios.  Compliance Trabalhista é muito mais do que cumprir a legislação, é uma ferramenta eficiente, que com as adequações necessárias cabe em qualquer empresa e atua como fator de reforço substancial na gestão de riscos e impactos, bem como na sustentabilidade dos negócios, do mercado e da sociedade.

  • Erika Mello, especialista em Compliance Trabalhista do PG Advogados.

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